quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Ciça, a Vitoriosa


A vitoriosa Ciça, com o jaleco do Vasco da Gama, ladeada por Larissa à sua esquerda e Jade à sua direita, ao lado de Jade sua mãe Ercilene Albarado, com fotografia na camisa de seu pai que tinha acabado de seguir seu caminho para o céu.
Fonte: Netvasco

Mostramos em que países como no México e Venezuela se um karateca consegue ganhar algum título sulamericano, ou panamerciano eles são logo cobertos de louros e até premiacões em dinheiro. Vimos estes exemplos nas reportagem dos karatecas como Ghilherme Domingez e Luman Castro Delgado. Em outra reportagem mostramos a karateca Honoria Mar, que por causa de seus títulos cabou entrando no Hall Eterno da Fama de todos os desportistas do México. O currículo de Honória é extenso, mas é muito umilde se comparado ao da karateca exemplar Ciça.


A atleta vascaína Maria Cecília (42 anos) ou simplesmente Ciça para os amigos, tinha tudo para ser mais uma personagem de uma dessas histórias que povoam o noticiário policial de nossa cidade. Nascida em uma família humilde não conheceu o pai. Ela e mais seis irmãos (Marcelo, Guilherme, Marcos, Celina, Eliza, que faleceu ainda bebê e Vânia) eram pobres, mas felizes.


A mãe, dona Ângela, sustentava a casa com o dinheirinho minguado do salário de diarista que ganhava lavando e passando roupas além de costurar para a vizinhança do Bairro de Fátima, centro do Rio, onde moravam. Guerreira e possuidora de uma fé inabalável em Deus, a quem dá o crédito por todas as coisas que passou até aqui e que, segunda ela, serviu como instrumento para fazê-la crescer como ser humano e até mesmo como atleta, Ciça acaba de voltar do Canadá trazendo a taça de campeã mundial de karatê (categoria única) disputada em Toronto.


Um sonho que começou a se desenhar quando a menininha pobre e separada do resto dos irmãos com apenas 7 anos de idade, se apaixonou pelo esporte aos 20, quando fez uma visita a academia de karatê ‘Kamikaze’, na rua do Bispo, Rio Comprido, centro do Rio. Ali, pela primeira vez ouviu o grito característico dos praticantes da milenar arte marcial oriental e quis ver de perto do que se tratava.


Foi amor à primeira vista. Naquele dia Ciça disse para si mesma: “É isso que eu quero para a minha vida”. De lá até nossos dias a menininha sem futuro e sem rumo passou a colecionar inúmeros troféus de campeonatos de karatê disputado ao redor do mundo (Argentina, Estados Unidos da América, Europa, África, Ásia e Oriente). Fã do astro Bruce Lee, Maria Cecília fez do amor ao esporte sua profissão de fé. Mas até aqui, a jornada tem sido dura.


A barra começou a pesar em 1973 quando os biscates da mãe dona Ângela foram escasseando e o dinheiro também. Com dificuldades para pagar o aluguel da casinha simples no Bairro de Fátima, centro do Rio, a família foi despejada e passou a morar na rua. Não fosse a solidariedade da vizinhança a história poderia ser outra.


Ciça sendo homenageada pelo presidente do Vasco da Gama Roberto Dinamite


Primeiro uma vizinha acolheu os irmãos, mas o Juizado de Menores (hoje Vara da Infância e Juventude) impediu a ‘adoção’ sob o argumento de que havia gente demais naquela casa. O resultado da ação é que os irmãos separaram. As meninas foram para o Educandário N.Sra. de Fátima, em Jacarepaguá (Zona Oeste) e os irmãos para a extinta Febem (em Quintino). “Mas Deus tinha um plano em nossas vidas”, justifica Ciça que é evangélica e congrega na Igreja Presbiteriana Esperança em Vargem Grande, desde os 20 anos de idade.



Sua sorte começou a mudar quando a dra. Maria Lúcia Barbosa Lima (advogada e comissária de menores ou anjo), levou a jovem para trabalhar em sua casa para cuidar do neto Bernardo de um ano e meio. Ali, permaneceu por três anos com casa, comida e roupa lavada além de estudar até concluir o 2º grau. Foi então recomendada pela própria patroa para trabalhar na casa da Dra. Ana Maria Xavier (também advogada) para cuidar do filho Fábio Augusto. Mas a juventude aliada a um vazio existencial levou Ciça a buscar resposta em várias relações amorosas que a decepcionaram e que culminaram no consumo exagerado de álcool e drogas ilícitas. Aos 19 anos, ela encontra trabalho no Centro Educacional Deofrildo Trotta. Mas a felicidade durou pouco. A escola é extinta e os professores resolvem tocar um projeto próprio: a criação de uma academia de esportes. Há males que vêm para o bem.



Foi aí, que o karatê conquistou Ciça definitivamente. O primeiro treino foi com um quimono emprestado por um lutador muito maior que ela. Mas isso não foi problema porque a vontade era grande e a fé num futuro melhor ainda maior. Entusiasmada pela filosofia empregada pelo karatê (conter a agressão, manter a calma em momentos tensos, dialogar sempre e respeitar o adversário) a jovem aspirante a campeã mergulhou de cabeça no esporte, aliás, no tatame.



Com oito anos de academia e faixa laranja na cintura, foi inscrita pelo inesquecível professor Eraldo Soares no Campeonato Carioca de Karatê nos anos 80 e ficou com o 3º lugar, derrotando outras campeãs de categorias superiores, inclusive faixas-pretas. Logo em seguida foi selecionada para representar o Rio na Copa Brasil Manoel Tobino. Entusiasmada com a possibilidade de mudar o rumo da sua vida através do esporte e realizar o sonho de dar uma casa para a sua mãe dona Ângela (que ainda não se realizou), a jovem Ciça se dedicou com vontade nos treinos e os resultados começaram a aparecer.

Foi selecionada para o Mundial do Egito em 88. Já chegou lá cantando marra e querendo enfrentar logo de cara a campeã japonesa. A falta de humildade lhe custou caro. Levou uma baita surra da nipônica, mas aprendeu a lição. Daí em diante, colocou em prática tudo o que a filosofia da arte marcial milenar ensinara além da fé na força superior do Criador: tetracampeã pan-americana, pentacampeã sul-americana, 12 vezes campeã estadual, dez vezes campeã brasileira, tricampeã mundial no Japão, campeã no Open de Paris, África do Sul, Angola e agora o tri no Canadá.



Tal proeza levou o nome de Maria Cecília para o Guiness-Book como a primeira latino-americana a conquistar títulos dentro do Japão, berço do karatê e no resto do mundo. Casada com Fábio Maia (ex-goleiro do América e treinador de goleiros, mas desempregado), Ciça tem três filhos que herdaram o talento da mãe para o esporte: Ana Carolina (13), faixa verde de karatê, Ana Bárbara (6) faixa vermelha e o caçula Allef (4) faixa branca.


Dona de uma fé contagiante em Deus e confiante de que o melhor está por chegar, a campeã entre um treino e outro ainda encontra tempo para dar aulas em projetos sociais como o “Betânia Esporte”, em Realengo, que fica na comunidade carente de Nogueira de Sá e o “Suderj Informa no Fumacê”, onde é claro, ministra aulas de karatê. Uma história curiosa aconteceu com a atleta nos Jogos Pan-Americanos de 2007. Primeira colocada na classificatória acabou ficando de fora sem nenhuma explicação convincente da Comissão Técnica.



Resultado: sua substituta apanhou feio durante a competição e não conquistou medalha. O fato provocou a ira da torcida que passou a gritar o seu nome no estádio: “Ciça! Ciça! Ciça!”. Era o reconhecimento definitivo à garra e determinação de uma menina pobre e sem casa que mudou o seu destino ao acreditar que vale a pena sonhar e a confiar em Deus.



Para nós, Ciça é simplesmente a maior karateca do mundo e de todos os tempos!!!


2 comentários:

Anônimo disse...

Simplesmente OSS!

Anônimo disse...

Simplesmente OSS!

Postar um comentário

Deixe aqui seu recado